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Mostrando postagens de dezembro, 2007

A retrospectiva do velho menestrel

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Nestor Kirjner Andei um bocado por Brasília no ano de 2007, fazendo o que gosto e trabalhando pela cultura da cidade. Não vi tudo, participei apenas daquilo a que pude assistir. Mas, modestamente, destaco algumas coisas que vi e ouvi com emoção e prazer, nesse triste ano político de nossa existência. E ELES CONTINUAM POR AÍ: No ano em que Renan, Mônica Veloso, George Bush e Hugo Chávez reinaram absolutos nas manchetes brasileiras, fica difícil falar em esperança. Meu xará argentino também deu uma força ao caudilhismo emergente na América Latina, promovendo a segunda ressurreição de Evita, desta vez com o nome de Cristina Kirchner. A “prima” é minha, mas vai sobrar pra todos nós! E o Evo boliviano? Que que é isso, Sílvio Luiz? Mas deixa pra lá! Coluna cultural não deve falar de política. Talvez seja melhor esquecer os perigos de 2008 e dar um passeio pela música do Planalto Central em 2007. Vamos lembrar o que houve de bom por aqui. Alô, Joaquim Barbosa! Vê lá, Mermão! Não vá decepciona

Convite para o aniversário de um perdedor

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Marco Antunes Eu quero convidá-lo para comemorar o nascimento de um cara que viveu muitos anos atrás. Um sujeito franzino que nunca teve porte de general e não sonhou jamais conduzir exércitos e batalhas. Um pobretão de família obscura cujo pai não passava de um simples operário e a mãe, pelo que se sabe, fora apenas doméstica. Nosso homenageado jamais se sentou entre os letrados de sua época como um igual. Suas letras eram mínimas, sua erudição inexistente e jamais investigou as sutilezas da filosofia ou enfrentou os mistérios da ciência. Dir-se-ia um homem comum que respeitava os costumes e cumpria as datas culturalmente acordadas. Você, com todo direito me perguntará agora pelos feitos que o notabilizam para que se o comemore. É uma justa pergunta sem resposta previsível ou com respostas povoadas mais de negativas que de afirmativas. Não lutou batalhas nem ganhou uma guerra; Não construiu monumentos nem governou seu povo; Não viajou pelos campos abstratos da mente nem descortinou no

Por quem os jingles dobram

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Eneida Coaracy Queridos amigos (do batente do dia-dia, não tão distantes, distanciados pelas circunstâncias da vida, de além-mares, daqui e de acolá), Cá estamos novamente encerrando este ciclo temporal chamado ANO, criado pelo homem para ajudá-lo a demarcar etapas, ciclos, movimentos, passagens. Sinos rebimbam, jingles ecoam repetidamente na mídia, urgindo todos a comprarem, presentearem-se, confraternizarem-se. O Natal está chegando! Um Novo Ano anuncia vida nova, promessas de realizações pessoais e de sonhos, mudanças e viagens. Tudo é mágico e possível. O verdadeiro sentido do Natal, perdendo-se nesta ruidosa confraternização consumista inventada pelo homem. Entretanto, torna-se praticamente impossível escapar do redemoinho natalino, de cuja força magnética ninguém parece conseguir escapar, inclusive eu própria, que aqui estou tentando me conectar aos meus amigos queridos e não me deixar fragmentar por esta ventania salpicada de falsas estrelinhas douradas — que cegam de tanto que

Felicidade, eu tenho!

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Sábado à tarde, comemoração do Dia das Mães na escola. Pela manhã, já ganhei o presente: um cartão tridimensional feito na aula de artes. No centro dele, um menininho com um coração pregado no peito diz que sou legal e que gosta muito de mim. O estacionamento, insuficiente em dias normais de aula, hoje cospe os carros para as quadras vizinhas. Paramos a quase um quilômetro de distância e fazemos o trajeto a pé, no sol escaldante das 15 horas. Dezenas de famílias fazem o mesmo. O pátio está lotado. Levo meu filho ao camarim, enquanto vou à Secretaria pegar a camiseta que devo usar no evento. Ela é preta e tem frase estampada em vermelho: “Felicidade, eu tenho!” A das crianças é branca, com os mesmos dizeres. Por precaução, encomendei o tamanho GG. Foi exagero: ela quase chega aos meus joelhos, mas não há outra disponível. A diretora lê um bonito texto, ao qual ninguém presta atenção. Todos se fazem a mesma pergunta: “Quando vai começar?”, ou melhor, “Quando vai terminar?” Com meia

Comentário sobre "Velhota, eu?"

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Cara Luci, Muito agradou-nos receber seu primeiro livro de crônicas e, mais ainda, ler o texto Felicidade, eu tenho! Dialogar com você por meio de seus enredos ambientados em Brasília foi um prazer. Parabéns pela sensibilidade, espontaneidade e sutileza de seus textos que, certamente, fazem-lhe porta-voz de muitos brasilienses no cotidiano de nossa cidade. Um abraço, Márcia Márcia Gomes Fernandes é diretora do Colégio Arvense. http://www.arvense.com.br/

Enamoramento 2

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Maria Amélia Costa Coisa estranha essa de querer o outro por perto, acercando-nos com paparicos e cuidados e a um passo poder tocar o seu braço e mergulhar pela abertura côncava entre o tecido e a pele em busca de um músculo contornado pelos movimentos do homem. Num instante se sentir em um tamanho que cabe nos poros que moldam o corpo e nesse mesmo instante deslizar inundando-se em abismos de sensações perpendiculares, doces, cegas. Confundir-se nele, movida pela inocência angelical que conduz a luz por olhos moventes numa posição que, abaixo, é de entrega confortável e dolente. Ele, sempre crescente, contorna o espaço e o tempo, alonga a paisagem. Os dedos dela, cúmplices no gesto, tateiam imprimindo marcas digitais reunindo, ali, a consciência do mundo. Depender dele. Ser, apenas nele. Sentada ao lado, não precisa de nada, apenas ficar ali e se deixar... Como um corpo sem alma, desprovido de essência e de sentido. Se deixar. Sem medo, sem angústia, sem pressa, sem frio. Um não ser.

Sem trololó nem xurumela

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— Eu vou lhe incomodar, mulher. A voz possante, o sotaque potiguar, as implicações que ela adivinhava no verbo “incomodar”, tudo isso dava à frase um forte apelo erótico. Será que o antigo colega de ginásio, agora reencontrado num curso de reciclagem na empresa, era igualmente vigoroso em outras áreas? Havia evidências disso: três ex-mulheres e sete filhos. Ela acabara de trazer das férias o minúsculo Dicionário de Potiguês e o volumoso Dicionário do Nordeste, com 5.000 palavras e expressões. Procurou em ambos, no verbete “incomodar”, algum sentido que confirmasse sua intuição — encontrou “perturbar”, que, por sua vez, remeteu a “desassossegar”. Sim, ela queria ser desassossegada. Aproveitou para estudar o minidicionário. Quem sabe usaria seus conhecimentos muito em breve? Por coincidência... não, por força do destino, reencontravam-se após 30 anos. Ela sempre o admirara de longe, na escola. Quem sabe era o homem da sua vida, como naquele filme do Tom Hanks? Imaginou-se desfrutando a

Um recado amoroso para minha amiga Rosângela

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Maria Amélia Costa Querida Rosângela: Ontem pela manhã e em tempos anteriores eu dizia pra você: Querida, tenha cuidado. Sei que você não está enxergando direito e por isso não consegue manter-se no seu eixo. Confusa, nesse labirinto das labirintites, você anda em zigue-zague numa cadência estranha. Por vezes, num movimento em espiral que a faz levar a mão à cabeça você diz: Por favor, me ajudem eu ainda não estou bem. Todo mundo sabe o quanto sofrem aqueles — e, principalmente, aquelas — que se distanciam do eixo que os mantém. Dizem que labirintite é uma coisa horrível! Mas é o distanciamento (de eixo, quero dizer!) o que nos maltrata. Mais uma vez, querida, cuidado. Por esses dias você estava saindo, a duras penas, de uma depressão. Todos sabem, também, que depressão é um buraco fundo, escuro e escorregadio. Há até quem escute línguas estranhas e promessas vãs quando adentra por buracos assim. Para uma pessoa com depressão e labirintite parece que não há salvação. Mas... Ontem, aind

Istrogonofe com safrão

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— O que tem de almoço, Ana? — Fiz istrogonofe, Ci. — Por que está amarelo desse jeito? — Tava muito branco, pus um pouquinho de safrão. — Oba! Você fez mousse de chocolate? — É arroz doce, Ci. O açúcar parece que queimou demais. — O baixinho almoçou? — Igual um leãozinho. — Ele comeu o strogonoff desse jeito? — Não, ele quis núguets com molho babicu. E um copão de Coca-Cola! — Levou o quê de lanche? — Orkut e chips. —Tem café novo, Ana? — O pó acabou, Ci. O coador também. — Vai lá comprar. Estou doida para tomar um café. — Tem outro problema. — Qual? — Vieram cortar o gás. — Por que você não me ligou? — Não gosto de incomodar a Ci. O moço disse que se pagasse na hora, não cortava. — Ai, ainda bem! Você pagou? — Não tinha mais dinheiro. — E o que eu deixei, Ana? — Gastei na floricultura. Ci gostou das gerbras, gostou?

Caminhos por dentro

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Maria Amélia Costa Era um desses finais de manhã de sol quente. Acabara de sair do consultório e se dirigia para o shopping. Em breve o calor do sol ficaria lá fora. Combinara com o filho de se encontrarem, mas ainda era cedo para o almoço e ele talvez demorasse a chegar. A porta automática se abriu, ela entrou e logo sentiu o conforto fresco que circula pelo interior de lugares assim. Ao seu lado havia muita gente nesse ir e vir que marca a humanidade inquieta dos humanos. Estava cercada por essas criaturas e sentia-se confortável. O conforto a fez sorrir enquanto subia pela escada rolante evitando segurar naquelas laterais que também rolam, mas que não acompanham com a mesma velocidade os degraus que sobem e descem como se tivessem vida própria – observara. Num pensamento solto avaliou que havia uma cumplicidade velada porque o consultório do psicólogo, o da massagista e o do dentista que ela, agora, freqüentava ficavam todos ali, nas imediações do lugar. Mas não se deteve nesse pens

O pequeno capitão

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— Mãe, se eu fizer uma pergunta, você não fica triste, deprimida, nem com cara de preocupada? — Não - respondeu a mulher, já acostumada com a abordagem do filho. — Jura? — Juro. — Como se faz uma adoção? Chegara o doloroso momento que ela vinha adiando e do qual não podia mais fugir. Tentou desconversar: — De bebês? — Não, mãe, de animais. Ficou calada, esperando que ele desviasse a atenção para outro assunto. Sabia bem aonde a conversa ia levar. Ele lhe estendeu um papel: — Está aqui o número do canil. Deu na televisão. Posso? Posso? Posso? — Pode - ela concordou, refém da velha promessa e do olhar suplicante. Há algum tempo ele vinha pedindo um cachorro. Nas longas férias de janeiro, sentiu-se só e voltou a insistir no pedido. — Tem certeza? Tem certeza de que tem certeza? Você está brava comigo? Não mesmo? — Sim, sim, não, não. Estava prestes a se iniciar a terceira experiência canina da pequena família. A primeira: Vivi, Yorkshire emotiva e carente, objeto de abaixo-assinado no pr