A retrospectiva do velho menestrel

Nestor Kirjner



Andei um bocado por Brasília no ano de 2007, fazendo o que gosto e trabalhando pela cultura da cidade. Não vi tudo, participei apenas daquilo a que pude assistir. Mas, modestamente, destaco algumas coisas que vi e ouvi com emoção e prazer, nesse triste ano político de nossa existência.

E ELES CONTINUAM POR AÍ: No ano em que Renan, Mônica Veloso, George Bush e Hugo Chávez reinaram absolutos nas manchetes brasileiras, fica difícil falar em esperança. Meu xará argentino também deu uma força ao caudilhismo emergente na América Latina, promovendo a segunda ressurreição de Evita, desta vez com o nome de Cristina Kirchner. A “prima” é minha, mas vai sobrar pra todos nós! E o Evo boliviano? Que que é isso, Sílvio Luiz? Mas deixa pra lá! Coluna cultural não deve falar de política. Talvez seja melhor esquecer os perigos de 2008 e dar um passeio pela música do Planalto Central em 2007. Vamos lembrar o que houve de bom por aqui. Alô, Joaquim Barbosa! Vê lá, Mermão! Não vá decepcionar a gente em 2008! Segura aí um pouco de ética, que a gente num “güenta” outro 2007, ano do cinismo descarado e da desmoralização da classe política atual, que absolveu o Renan pra fechar o ano com “chave de ouro”.

ANDANÇAS CULTURAIS DO VELHO MENESTREL: Preocupado com tudo isso, e bastante acabrunhado! Mesmo assim, o Velho Menestrel não pode queixar-se de 2007, que lhe propiciou saborosas andanças pelo ambiente cultural de Brasília. Pude ver o Coral Alegria, onde exerço a Direção Musical, ser incorporado pela CODEPLAN, crescer, refinar-se e sobreviver à mudança do Governo local, sem descontinuidade de suas atividades sócio-culturais. Parabéns à regente Ana Boccucci, vitoriosa nessa luta! Assisti também a grandes reuniões no Clube do Choro, que continua a ser um marcante agente cultural desta cidade. Parabéns, mais uma vez, a Reco do Bandolim, o eterno homenageado! Pude participar da 100ª reunião do Clube da Bossa Nova, até para me convencer de que não sou mesmo um bossanovista. Mas não posso deixar de assinalar o trabalho de Dickran Berberian à frente daquela entidade, apoiada pelo sempre maestro Bohumil Med, que cede as dependências de sua livraria para a realização dos encontros do Clube. Já os “Seresteiros do Cerrado” continuaram a realizar reuniões em que a tônica foi a preservação do cancioneiro mais tradicional da MPB. Os parabéns, agora, vão para Dom Wilson, incansável batalhador dessa causa um tanto inglória, mas que tem nos Seresteiros um grande foco de resistência. Sônia Ferreira, presidente do Centro de Cultura do Centro-Oeste, conseguiu reeditar sua luxuosa antologia dos artistas dos quatro Estados de nossa Região, viajando o ano todo na busca desse intento. A Feira do Livro foi testemunha de sua vitória sobre todas as dificuldades que a ela se antepuseram. Salomão di Pádua, com sua voz privilegiada e rigorosa seleção de repertório, foi o anfitrião brasiliense naquele que acredito ter sido um dos shows do ano em Brasília. Ele recebeu Vânia Bastos, extraordinária cantora brasileira que a mídia insiste em ignorar. Divina Vânia, uma Elizeth renascida! E, por falar em divas, Célia Rabelo, sempre muito talentosa, mostrou uma capacidade de trabalho incrível e esteve em todos os lugares em que a boa música poderia dizer “presente”. Foi a “formiguinha do ano”, incansável como artista e brilhante como cantora. Conceição Salles ameaçou nos deixar de vez, mas cedeu aos apelos do grande Antônio Miranda, que, além de conduzir com brilho essa primeira fase da Biblioteca Nacional, reintegrou Conceição à cena brasiliense. Miranda foi homenageado pelo Sindicato dos Escritores nas dependências do UniCeub, onde o coordenador cultural Victor Boccucci e a professora Lúcia Leone, da Associação de Docentes, estimulam a trajetória de muitos artistas brasilienses e valorizam datas importantes do calendário cultural, como a Semana do Artesão e o Dia do Idoso. Como reverência ao trabalho desses educadores, devo informar que foi no auditório do UniCeub que encontrei guarida para minha arte e minhas canções, e onde fiz a mais bem sucedida apresentação deste ano de 2007. Cabe citar, ainda, a brilhante participação de Ydê Afonso e Luiz Carlos Cerqueira na Diretoria da Casa do Poeta Brasileiro, que fez ressurgir a entidade na cena cultural da cidade com base no trabalho criativo e pertinaz desses dois consagrados artistas candangos. Finalmente, quero destacar a personalidade do ano, aquela que mais marcou minhas andanças culturais pelos teatros e ambientes culturais de Brasília. Os brilhantes saraus, aulas, oficinas e palestras levam-me a apontar Marco Antunes e o Núcleo de Literatura da Câmara dos Deputados como a grande presença do ano nas atividades culturais de Brasília em que tive oportunidade de participar. Além de ativo e profícuo produtor cultural, Marco é um excepcional intérprete de textos e poemas. De Brecht a Caetano Veloso, de Clarice Lispector a Cecília Meirelles, de Drummond a Mário Quintana, tudo o que for genial tem abrigo na atividade desse iluminado cultor das artes e da beleza espiritual.

CULTURA É FUNDAMENTAL: Muito mais do que entretenimento, cultura é comportamento, é o desenvolvimento intelectual do ser social, aquilo que realizamos (ou não) a partir da educação e da informação que recebemos. Participar da vida cultural não é luxo nem requinte, mas necessidade essencial do ser humano. Pense nisso, e incorpore essa preocupação nos planos que você está formulando para 2008! E tenha um feliz período de 365 dias, quando seu espírito, elevado pela cultura, saberá mais bem compreender os absurdos e paradoxos da vida que nos é oferecida como dádiva. Ou, traduzindo tudo isso num lugar-comum: Feliz Ano Novo, Mermão!!!! Tudo de bom pra você!!!




LAGO NOTÍCIAS NO. 131
DEZEMBRO DE 2007














Nestor Kirjner é autor da "Sinfonia da Cidade Nova" e mantém a coluna "Toques Culturais", há oito anos ininterruptos, no jornal Lago Notícias.


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