A moça do Fujioka

 



Luci Afonso

 

Toda sexta-feira, às 16h, vou ao Fujioka de Sobradinho revelar fotos. Eu digo “revelar”, como antigamente, porque ainda não me acostumei com a palavra “imprimir”. Fotos são minha paixão desde criança. Elas prolongam os bons momentos, quase os cristalizam. Elas atestam que as lembranças são verdadeiras.  Além disso, preveem o futuro de uma forma que só entenderemos mais tarde.

Tenho muitos álbuns, cada foto revelando em detalhe a emoção daquele minuto que nunca mais se repetirá. Uma vez posta no álbum, a foto não sairá mais dele. Não suporto álbuns incompletos ou vazios. Estou sempre revelando fotos que os preencham.

Há pouco tempo, descobri uma foto de trinta anos atrás, em que eu estava linda e sorridente. Fiz cópias e espalhei pela casa. Sempre que entro no quarto, vejo a linda moça me sorrindo com um frescor que me reanima. Aproveitei para colocar, ao lado da foto, um jarro com flores de buganvília vermelha.

Entro no Fujioka e desperto, mais uma vez, a atenção da moça das fotos. Isso acontece há meses. O nome é Indiara, mas poderia ser Anjo. Ela se aproxima e pergunta:

— Tudo bem com a senhora? Já estava com saudades.

Por causa da máscara, respondo só com os olhos: Sim, eu também.

— A senhora não quer se sentar? — ela me dá o braço e me conduz até a mesa como se eu fosse uma avó muito querida. Em frente à mesa, já posicionou a poltrona amarela, a mais confortável da loja, perto da parede, onde ligo o carregador que ela sempre me empresta.

— O que vamos revelar hoje? — ela pergunta, com um sorriso de pureza absoluta.

Tiro da bolsa, bem devagar, as fotos do dia. Hoje vou cumprir uma promessa feita à minha afilhada, que há alguns meses veio morar conosco: uma foto sozinha, outra com o namorado. Na sala, há muitas fotos de família — só falta a dela. Compro também dois portarretratos, um deles escrito “Te amo”.

— Que linda! É sua filha? — Indiara pergunta, olhando as fotos que eu trouxe.

— Afilhada — respondo, selecionando-as no celular.

— Pode escolher tranquila, não tem pressa — ela diz, o sorriso imenso. — A senhora aceita o de sempre?

—Sim, querida.

Daí a pouco ela aparece com um capuccino fumegante e deliciosas trancinhas de nata.

— É minha mãe que faz — ela explica. — Eu trago toda sexta para a senhora.

—Só pra mim?

— Sim — ela responde, quase envergonhada.

Descubro que fui adotada pela linda moça de cabelos e olhos negros, a pele clara, o sorriso que em poucos minutos faz a volta ao mundo e dele só traz boas-novas.

Quando as fotos ficam prontas, ela chama o Uber para mim, me acompanha até a saída e espera comigo na calçada até o carro chegar. Depois me ajuda a entrar, afivela o cinto e recomenda ao motorista que tenha cuidado na viagem.

— Até sexta — nos despedimos.

Volto tranquila para casa. Deus ainda faz anjos como antigamente.


Imagem: https://blog.dhonellalojavirtual.com.br/descubra-o-nome-do-seu-anjo-da-guarda-pela-sua-data-de-nascimento/

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