Quase nada




Luci Afonso

Quase nada resta de você. Há outro corpo quente embaixo do cobertor. Fiz uma playlist das músicas que te mandaria se ainda te amasse. Seu rosto raramente aparece em meus sonhos. Braços fortes me conduzem na dança que nunca encenamos.
Como ela é? Te dá o mesmo prazer? Te espia com olhos de infância? Fala durante o sono?  Como ela é? Espera você acordar para começar o dia? Adora café na cama? Sem ela não amanhece?
Quase nada restava de mim. Deixei aí meus desejos mais sinceros. A aliança de noiva, o altar à beira do lago. O resgate do afeto perdido, o laço indissolúvel. A paz final.
Quase tudo nos separa. Sua voz está cada vez mais longe. Sua pele se esvai aos poucos na névoa que encobre sua lembrança. Minhas palavras estão de luto. Quando ele passar, vestirei as palavras brancas da saudade. Quase tudo restará de mim.

Janeiro 2020

(Foto: Diego Feitosa)



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