As árvores estão mais verdes



Luci Afonso

Cheguei a pensar que não tinha assunto para escrever, até que descemos à área verde do bloco e nos sentamos no banco amarelo, que ficava na sombra à tarde. O parquinho estava cheio de crianças brincando, e a quadra esportiva, de adultos jogando futebol. Cães andavam com os donos. Famílias inteiras passeavam, com um picolé ou um sorvete para se refrescar.
— As árvores estão mais verdes —disse ele, assim que nos acomodamos. A voz era doce, quase infantil.  
— E o céu, está mais azul? — brinquei.
— Sim, está. Acho que sim — ele mostrou o sorriso meigo, que me enchia de esperança.
— Para mim também — respondi.
Observei o jovem magro e barbudo ao meu lado, que se divertia com o celular. Ele não era vaidoso, mas de repente sentira vontade de ter coisas. A cada dia, uma novidade: camisetas com dizeres irreverentes, óculos que havíamos comprado aquela semana mesmo — um para ler, outro para dirigir; o relógio com visor digital maneiro; a corrente que ele importara da China, com uma pequena bola de vidro contendo um microuniverso azul.
— Meu universo — ele explicou, com a doçura habitual.
Depois de muito tempo sem interesse pelo mundo exterior, ele finalmente começara a melhorar. A mudança era perceptível em pequenos acontecimentos, que me davam profunda alegria. Ele passou, por exemplo, a tirar selfies e a postá-las na Internet, além de fotos dos gatos e dos lugares por onde anda quando sai para tomar sol — outra novidade. É um fotógrafo sensível, que capta imagens poéticas e fugidias. Vieram os encontros com garotas do Tinder, o sushi na casa de amigos, as sessões de cinema, o colega que veio dormir em nossa casa. Na próxima semana, vamos olhar seu primeiro carro.
Eu o vejo nascer outra vez. Aos poucos, ambos retornamos à realidade em cores, após longo período confinados ao preto e branco. Caminhamos juntos, a passos curtos, em direção à vida. Ao nosso redor, árvores mais verdes, céu mais azul e bancos amarelos como o sol.  


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