Beautiful
Luci Afonso
Nove
de janeiro de 2018. Noite de gala no Teatro Majestic, Broadway, Nova Iorque.
Casais elegantes descem de carros luxuosos: os homens de smoking, as mulheres de longos pretos, realçados por colares de
pérolas enormes e, com certeza, autênticas. Os casacos de peles finalizam o
visual requintado. Sinto-me como num filme de Hollywood. Meu vestido é branco
e, meu casaco, vermelho. Pareço uma Branca de Neve madura ou uma Chapeuzinho
Vermelho que cresceu de repente. Sou também uma linda mulher, uma bonequinha de
luxo, uma noiva em fuga. Sou todas as personagens que posso lembrar. Posso ter
todos os finais felizes que desejar.
Hoje
é meu aniversário de 58 anos. Faz 10 graus negativos, e se espera uma
tempestade de neve na madrugada. O clima não importa. O tempo parou: era meu
sonho estar em Nova Iorque neste dia e assistir ao musical “O Fantasma da
Ópera”, em cartaz há quase trinta anos. Aqui estou, em meio a gente do mundo
inteiro, aguardando para desfrutar a beleza do espetáculo. O licor de damasco
servido no saguão me deixou inebriada, assim como o interior do teatro antigo,
que parece exalar a emoção de tantos que se sentaram nas poltronas vermelhas e
pisaram no carpete florido, esperando o surgimento dos atores no grandioso palco
de madeira esculpida.
Distraio-me
observando a plateia e sou surpreendida por uma voz masculina:
—
Excuse me, Miss — um distinto senhor
de smoking e sua esposa pedem licença
para alcançar as poltronas do meu lado direito.
—
Thank you, Miss — diz a esposa.
Enquanto
a cortina não se abre, começamos uma conversa em inglês. Digo ao casal que é
meu aniversário. Eles me contam que nesta data celebram o aniversário de
casamento, assistindo ao espetáculo em que haviam se conhecido na primeira temporada,
há trinta anos — ele, cantor, ela, bailarina. É um presente inesperado conhecer
essa história de amor.
—
Happy birthday, dear! — eles desejam.
—
Happy anniversary! — eu retribuo.
As
luzes se apagam. As vozes dos atores são impressionantes, o cenário é esplêndido.
Meu vizinho de poltrona se levanta muitas vezes para aplaudir as cenas mais tocantes:
—
Beautiful! Beautiful! — ele grita,
sem esconder as lágrimas
Chegamos
à última cena. Nem todas as personagens têm finais felizes. Não sei como será o
meu, mas neste momento sinto-me inteira, completa, pertencida. É tudo o que
quero.
Despeço-me
do casal e, na volta para o hotel, desejo a mim mesma, sem disfarçar o sorriso:
—
Feliz aniversário, querida!
Minhas
palavras se misturam às da multidão que sai do teatro e ecoam na neve silenciosa
que começa a cair.
Imagem:
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