Falar do quê?
Luci Afonso Acordo na manhã fria em meio a esperanças e medos. A vontade é dormir mais, porém as palavras já me espiam atrás da porta. Vão chegando devagar, a princípio tímidas, logo atrevidas. Sobem na cama, arregaçam a cortina e fazem cócegas até eu me levantar. Me empurram em direção ao banheiro, separam os remédios na primeira gaveta do criado-mudo, trazem meu vestido de escrever. Após o café, me arrastam para o computador. A tela branca as enlouquece. Algumas já escolhem seu lugar, mesmo sabendo que é provisório. As mais íntimas se sentam em meus ombros, esperando sua vez, e a maior parte se divide em grupos animados, certas de que serão usadas. Todo dia lhes pergunto : vamos falar do quê? E elas respondem: ah, de qualquer coisa! Tenho pressa: as esperanças aumentam ao longo do dia, enquanto os medos diminuem, mas eles voltam à noite, trazendo suas amigas, as dores. Difícil escrever quando elas chegam. Às 10 horas, fazemos um intervalo para outra xícara de café. Pr