Aceita-se
Luci Afonso Aprendi cedo a fazer trocas. Um silêncio por uma aprovação, um sorriso por um carinho, uma dor por um doce, um dente por um ioiô, um ioiô por uma bicicleta. Aos sete anos, ganhei de Natal um bambolê e a primeira bicicleta. Não dei importância ao primeiro, mas fiquei fascinada pela segunda. Aprendi a andar nela sozinha, no quintal de terra onde antes morava nosso cachorro louco, que teve de ser morto a tiro de espingarda. Agora o lugar era só meu, e eu aproveitava para fazer coisas escondidas, como levar um tombo após o outro. Até que, num domingo depois da missa, veio a inspiração: — Meu Deus, se o Senhor não me deixar cair, vou beijar o chão três vezes! Deus ouviu minha súplica, porque na primeira tentativa me equilibrei o suficiente para pedalar até o muro. Renovei o pedido em voz alta e fui atendida. Gritei, e não caí mais. Ninguém presenciou o milagre, por isso a surpresa foi geral quando, naquele dia mesmo, ainda com o gosto de terra, comecei a m