Rachel de Queiroz A noção comum que se tem a respeito do escritor é que pessoas excepcionais, nascidas com o dom de escrever bem o belo, são periodicamente visitadas por uma espécie de iluminação das musas, ou do Espírito Santo, ou de um outro espírito propriamente dito – fenômeno a que se dá o nome de "inspiração". O escritor fica sendo assim uma espécie de agente ou médium, que apenas capta as inspirações sobre ele descidas, manipulando-as no papel graças ‘aquele’ dom de nascimento que é a sua marca. Pode ser que existam esses privilegiados – mas os que conheço são diferentes. Não há nada de súbito, nem de claro, nem de fácil. O processo todo é penoso e dolorido – e se pode comparar a alguma coisa, digamos que se parece muito com um processo fisiológico –, que se assemelha terrivelmente a uma gestação, cujo parto se arrastasse por muitos meses e até anos. Começa você sentindo vagamente que tem umas coisas para dizer ou uma história para contar. Ou, às vezes, ambas. Fi