Menino Pai
Luci Afonso
Menino, chegou a hora. Nasça devagar, não tenha pressa.
Brinque de carrinho, jogue bola. Namore as duas irmãs, case com a mais bonita.
Daqui a vinte anos serei sua filha.
Você me levará a todo lugar. Vai me mostrar aos amigos, tirar fotos, me encher de presentes. Vai me ensinar a nadar, sentirá orgulho no recital de piano e no balé.
Quando eu fizer dez anos, me deixará pela primeira vez. Perguntarei, aflita, aonde vai, e ouvirei apenas: — Para longe, querida.
Aos quinze, desejarei a nova separação. Terei pesadelos de que você voltou e está no bar da esquina.
Você não conhecerá meus homens, todos parecidos com você. Não levará seu neto para tomar sorvete.
Não nos falaremos mais. Ao telefone, não conseguirei dizer o quanto sinto sua falta, apenas ouvirei sua respiração ansiosa. Receberemos a notícia num domingo bonito demais para se partir.
Pai, até chegar a hora, celebrarei sozinha, com uma lágrima de cristal, o dia em que você nasceu.
(Imagem: "Materna", pastel a óleo de Luci Afonso)
Triste, doído, forte e lindo! Desses que deixam a gente pensando por muito, muito tempo...Beijos!
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