E o cronista, o que é?

Machado de Assis dizia que o cronista é uma espécie de colibri que beija um assunto aqui, outro ali. Veríssimo diz que o cronista é como uma galinha, bota seu ovo regularmente, e Carlos Eduardo Novaes define as crônicas como laranjas: podem ser doces ou azedas, e ser consumidas na poltrona da casa ou espremidas nas salas de aula.

Para atender à crônica é necessário considerar o espaço em que ela se insere. E esse espaço é ambíguo. Ela pertence à série jornalística e à série literária. É escrita em jornais e revistas que são consumidos rapidamente e esquecidos. Mas, se for realmente um produto literário, será logo resgatada em livro.

No espaço da crônica, há uma troca de intersubjetividades. O leitor entra em outra frequência. Rubem Braga escrevia em FM, a sonoridade de sua frase e a melodia do pensamento têm função na comunicação.

Existe uma complexa relação do cronista com o tempo. Vinícius certa vez se referiu ao fato de que, chamado para ser cronista da Última Hora, pensou em ter sempre umas crônicas adiantadas, para dormir mais tranquilo. Não conseguiu. O cronista acaba gostando do desafio da folha em branco.

O cronista escreve com cronômetro na alma. Existe um tempo veloz de elaboração do texto e sua crônica atinge um amplo espaço de leitores, tendo um consumo imediato. A relação com seu público é quente, mas ao cronista pode acontecer de sobreviver ao seu tempo, vingando-se do seu Cronos.

O cronista é um indivíduo encharcado de seu tempo. Enfim, um escritor crônico.

(Trechos de Teoria da crônica, de Affonso Romano de Sant’Anna, publicada no livro “A sedução da palavra”, Editora Letraviva, Brasília, 2000)

Comentários