A Salamandra Cor de Laranja
Eneida Coaracy
Salamandras são animais anfíbios conhecidos pela capacidade de auto-regeneração de suas caudas quando mutiladas. A rapidez com que esta parte do corpo desses pequeninos animais se regenera, após terem sofrido agressões externas, inspirou uma amiga ao escolher um presente para mim. Assim, fui surpreendida com este delicado pequeno mimo, feito de vidro alaranjado, na forma de uma espevitada salamandra.
— Como se chama este animalzinho mesmo em inglês? Perguntei-lhe ao receber o presente, pois a amiga em questão é americana.
— ‘Salamandra’. Respondeu-me. Elas têm uma capacidade incrível de se auto-regenerarem.
— Ah! Sim. Salamandra, como em português. Sei o que é... Lindinha. Muito obrigada mesmo. Você não se emenda. Está me estragando de tanto mimo. Acrescentei.
Íamos a uma festa naquele dia e o presente me foi dado antes de sairmos juntas. Voltei com a salamandrinha guardada na minha pequena bolsa de festa e, ao chegar em casa, abri o embrulhinho para admirar mais uma vez o meu precioso presente e ponderar sobre os seus muitos significados. Só uma amiga muito sensível e próxima conseguiria ligar com tanto afeto e carinho a imagem de uma salamandra à minha, neste momento tão conturbado e desafiador da minha vida.
A pequena salamandra está aqui ao meu lado, junto ao meu laptop, a sorrir-me encorajadoramente, com sua caudinha ligeiramente levantada, parecendo querer dizer-me:
— Posso ter quantas caudas quiser ter... Você também!
Miro a minha nova amiguinha alaranjada e continuo a nossa conversa telepática:
— Mas ter a cauda cortada dói muito... Acho que prefiro continuar com a minha velha cauda... Acrescentei.
— Caudas envelhecidas ficam pesadas e lentas. Acabamos por ter que arrastá-las conosco pela vida afora. Caudas novas são leves e flexíveis. Elas podem ter outros formatos e nos tornar mais ágeis e versáteis. Há que se arriscar e acreditar na transformação. Esta cauda curtinha e riscadinha de azul que tenho agora é a terceira numa seqüência de três cortes que sofri. E é a que me leva mais longe, mais rapidamente e com mais leveza. É a minha melhor conquista. Replicou a salamandra.
Olhei para trás, tentando ver exatamente onde nasceria a minha nova cauda, imaginando se seria longa ou curta, lisa ou enrugada. Teria algum detalhe azul como a da minha amiga salamandra? Para onde me levaria a minha nova cauda?
Nesta noite, sonhei que havia me transformado em uma linda salamandra alaranjada que resolvera explorar os telhados das casas vizinhas, numa viagem ao desconhecido mundo das caudas pintadas de azul, que as salamandras alaranjadas sabem desfrutar tão bem e com tanta sabedoria. E a minha nova cauda era da cor do arco-íris! Eu subia com rapidez pelos telhados e a minha cauda brilhava no escuro, iluminando a noite sem luar. Eu me sentia salamandra!
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