Olho de Ciclone







Eneida Coaracy

Vejo a veia nervosa 
Conectar o céu e a terra. 
Vejo grossas lágrimas encharcarem 
O solo apavorado cá em baixo. 
Vejo o jato irado e molhado 
Tombar sobre a vida, 
Cair rumo abaixo. 
 Vejo a queda contorcida. 
Vejo nuvens delirarem.
 Inchadas, transbordarem.
 Telhados, postes, fiação,
 Tudo a dançar ao relento 
A loucura dos sons do vento.
 Vejo o canal lacrimal de Deus
 Inchar e chorar
 As dores do mundo.
 Doido, perdido na Ventania 
que assoprou os trastes do homem, 
Está o homem nu. 
O homem vê uma cicatriz no céu. 
O homem vê os nervos de Deus. 
 Eu, no meu lamento,
 Maldigo as cicatrizes da cidade. 
Vejo o mundo ao redor de pernas pros ares. 
Vejo as veias do firmamento repuxarem nuvens,
 Assustarem o solo encolhido cá em baixo.
Vejo a negra vastidão solitária. 
Vejo uma cicatriz no céu 
Doer no olhar. 
 Vejo o ciclone chorar

Poema finalista do Prêmio OFF-FLIP de Literatura 2006-2007. A coletânea, publicada em parceria com a Quarto Setor Editorial, será lançada durante a OFF-FLIP 2008, entre 2 e 6 de julho, paralelamente à Festa Literária de Paraty. A autora estará presente.

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