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Mostrando postagens de 2008

Reencontro

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Luci Afonso (Para Marco) A palavra me chamou, baixinho: — Volta! Estou com tanta saudade... Temendo nova separação, Fui bem devagar ao seu encontro. Afinal nos reconciliamos: Hoje passeamos ao pôr-do-sol E fazemos amor de madrugada. Eu a trato com doçura; Ela me chama de meu bem E faz chuva quando quero dormir. Não sinto mais a tristeza das manhãs. Estou feliz E assustada também.

A Muriçoca

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Emanuel Mazza Imersa em sua glória ela pousava cantando, cantava não, fruía as asas num som agudo, estridente, em seu passeio de caçadora. O corpo bojudo, saciado de sangue, denunciava-lhe a placidez, a tranqüilidade. Estava no repasto e a noite fazia-se alta, acobertada no silêncio da madrugada. A caça sobre a cama, irrequieta, tentando dormir. Envolvia-se toda no lençol, abraçava o travesseiro em torno das orelhas. Em vão! Não conseguiria o sossego tão necessário para o dia de trabalho a seguir. Por muitas vezes havia levantado e perseguido o inseto repelente que teimava em incomodá-lo. Ele era astuto, porém, rapidamente escapava, camuflado na sua pequenez, inalcançável nas alturas do teto. O quarto sombrio de repouso do hospital denunciava tudo que não poderia ser: uma noite de trabalho perturbada não por pacientes a procura de socorro, mas por um, e apenas um, inseto infame que escapara do banheiro. Maldita a hora em que se lhe abriram as portas da prisão. Eram dois habitantes que

Será que você merece um ano novo?

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Marco Antunes Prezado amigo! Venho hoje desejar a você um feliz ano novo, mas antes, gostaria de fazer-lhe algumas perguntas pertinentes para saber se vão adiantar de alguma coisa meus sinceros votos em breve formulados. Tudo bem pra você? Sei que serão muitas perguntas e que você é pessoa das mais ocupadas e que, como costuma dizer, seu tempo é dinheiro, nesse caso, restaria desejar-lhe que seu próximo ano seja um cofre do qual só você saiba o segredo. É verdade que, se seu ano for assim, há de ser bem escuro e abafado, mas quem sabe você se ilumine com o brilho das barras de ouro de suas ocupações inadiáveis e se abane com as cédulas de tempo produtivo. Se diante dessa constrangedora imagem, o distinto amigo resolveu sentar-se um pouco e responder às perguntas, sugiro que faça, então, o firme propósito de responder com rigorosa honestidade às minhas curiosas indagações. Sim, exatamente isso, não porque tema ser enganado, mas porque temo que se engane a si próprio e a franqueza das re

Mensagem de Natal

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Luiz Carlos Ribeiro Borges Em dezembro cintilam os signos de natal. Não, não luzes e estrelas ou paisagens com neve; nem, ao redor da árvore, as caixas coloridas. Outros signos existem, sutis, quase invisíveis, expressos nos olhares e silêncios tácitos: uma alegria urgente perambula nas ruas, mostra-se em cada esquina nos rostos transeuntes. Insensata alegria, ancestral e pagã, em que, sem dizer nada, no outro me reconheço. As luzes do natal são o signo visível deste diverso símbolo: a chama que nos anima. A esse entusiasmo, em que nos descobrimos parceiros de viagem, irmãos de travessia, a essa chama vital podemos chamar: Deus; ou então, simplesmente, dizê-la: humanidade. Luiz Carlos Ribeiro Borges nasceu em Guaraci, no interior do Estado de São Paulo, e reside em Campinas desde 1956. É escritor, crítico e cineasta, membro da Academia Campinense de Letras. borges.luiz@terra.com.br

Bifurcação

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Luci Afonso Na manhã de quinta-feira, resolvi encarar a chuva e o trânsito até o Parkshopping para comprar o presente do meu filho: um jogo eletrônico recém-lançado, que eu esperava encontrar no templo FNAC da tecnologia. Este ano estou sem dinheiro, graças a Deus, e só vou dar esse presente. Eu planejava desincumbir-me da tarefa em pouco tempo e ainda voltar para o almoço em casa. A compra foi rápida. Demorada foi a chegada ao shopping. Em vez de ir pelo Eixão, como sempre faço, decidi usar a EPIA. Dirijo pouco fora do Plano Piloto, e por isso não conheço as recentes duplicações e viadutos construídos pelo GDF. Após a Rodoferroviária, percebi que estava na faixa da direita, em direção à Estrutural, e que deveria pegar a da esquerda. Não deu tempo. Resultado: fui parar na rodovia sem retorno que leva a Taguatinga e Ceilândia. Tentei ver a situação de forma positiva. Quem sabe, aquele era um sinal de que eu não deveria ir ao Parkshopping naquela hora, naquele dia? Lembrei-me de experiên

Asa negra

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Emanuel Mazza Ele sempre sonha com aquela rua. É uma rua estreita, coberta com pedras antigas de um calçamento que desce a ladeira e vai dar numa praça. A praça se abre em muitas outras vias, cercada de uma igreja e tantas outras casas que se perdem no arcabouço da memória. Dessa vez ele voa baixo, pesado, quase arrastando. Por mais que se esforce não consegue alcançar o tão almejado céu, o que vê é um céu escuro e opaco da noite de breu sem fim. Não há nuvens no horizonte límpido e frio da consciência, exceto uma ou outra carregada de chuva, que, tão pesadas como ele, parecem se arrastar com o vento. Na verdade, não há horizonte, e toda natureza conspira contra ele naquele momento, nem o vento o suporta. Nem ele mesmo se suporta. Assim, fatalmente será agarrado. Sim, há um perseguidor, é então que ele o vê, a poucos passos, não consegue uma noção concreta de quem está por trás, é tudo um sonho mesmo, e se virar muito a cabeça certamente irá cair. Ele voa, tenta em desespero bater mais

Você é ilunga?

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A empresa britânica Today Translations ouviu mil tradutores de todo o mundo para selecionar as dez palavras mais difíceis de ser traduzidas. A palavra saudade , exclusiva da língua portuguesa, está em 7º lugar. A primeira posição ficou com a palavra ilunga . Ela pertence ao idioma tshiluba, do Congo, e traduz “ uma pessoa que está disposta a perdoar uma ofensa numa primeira vez, a tolerá-la numa segunda ocasião, mas que jamais perdoará pela terceira vez ”. Em segundo lugar ficou a palavra shlimazi , em ídiche (língua germânica falada por judeus, especialmente na Europa Central e Oriental), que significa " uma pessoa cronicamente azarada "; e em terceiro, radioukacz , em polaco, que significa " uma pessoa que trabalhou como telegrafista para os movimentos de resistência ao domínio soviético nos países da antiga Cortina de Ferro ". Lista das dez palavras consideradas de mais difícil tradução: 1. Ilunga (tshiluba) - uma pessoa que está disposta a perdoar qualquer malt

Dicas para escrever bem

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· Desnecessário faz-se empregar estilo de escrita demasiadamente rebuscado, conforme deve ser do conhecimento de V.Sa. Outrossim, tal prática advém de esmero excessivo, que beira o exibicionismo narcisístico. · Evite abrev., etc. · “não esqueça das maiúsculas”, como já dizia carlos machado, meu professor lá no colégio santa efigênia, em salvador, bahia. · Fuja dos lugares-comuns como o diabo foge da cruz. · Estrangeirismos estão out. · Seja seletivo no uso de gírias, bicho, mesmo que sejam maneiras, sacou? · Nunca generalize: generalizar sempre é um erro. · Evite repetir a mesma palavra, pois essa palavra vai ficar repetitiva e a repetição vai fazer com que a palavra seja repetida. · Não abuse das citações. Como costuma dizer meu pai: “Quem cita os outros não tem idéias próprias”. · Frases incompletas podem causar. · Cuidado com a orthographia, para não estrupar a língua. · Não seja redundante, não é preciso dizer a mesma coisa de formas diferentes, isto é, basta mencionar cada argumen

Resolvida

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Luci Afonso Você finge que não me vê. Eu a enxergo em todos os detalhes. Sua roupa tem um colorido deslumbrante. Seus acessórios são grandes e caros. Sua voz tem um verniz que se despedaça à menor contrariedade. Seus olhos bem maquiados choram lágrimas rasas. Seu umbigo é uma cratera em que se perdem até grandes obras da história universal. O pensador de Rodin foi tragado para o fundo e nunca mais pensou. Você tem cursos, nós já entendemos, mas quem não os tem? Sua música é paródia. Seus versos, caricatura. Sua voz, desafinada. As pessoas a aplaudem para puxar o saco. Seus pés estão gordos e mal cabem nos sapatos de grife. Você está achatada como um sapo no pântano. Logo começará a coaxar. Ah, se você me visse!... Eu me espelharia na sua autoconfiança. Apreciaria seu bom gosto, sua sofisticação, sua sensibilidade. Aplaudiria sua música, seus versos, suas criações, e poderia até acreditar em... genialidade! Admiraria sua silhueta madura e seus pés bem fornidos. Sua voz soaria doce como

Reciclagem

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Emanuel Mazza O dia ainda não amanhecera. Era madrugada escura e uma névoa seca, bem fria, cobria o ar, sugerindo vagamente a lua e algumas estrelas. O homem despertou de um torpor, demorando em reconhecer onde estava, mas então se recorda: era um pequeno quarto feito de partes de papelão entrelaçadas por fitas adesivas. Ele limpou os olhos com os dedos da mão e mirou o subir e descer do colo da mulher a seu lado, enquanto ouvia o respirar calmo dos filhos no chão, protegidos por folhas de jornal. O frio invadia o quarto com seu peso de chumbo, e penetrava fundo nos ossos. Sentiu o crepitar de uma fogueira acesa lá fora, disposta no centro de um círculo de outros quadrados de papel, que o chamava como o apelo de um farol aos navegantes. Sua vontade, entretanto, era de caminhar lentamente em direção ao fogo, e se fundir com ele, na tentativa de acabar com o frio medonho, largar a própria carne ao sabor das chamas e com essa aflição final dar cabo de sua dor infinita. Chegou o mais próx

Mais Uma de Almoço (Geme Geme)

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Isolda Marinho Esta é mais uma das manjadas histórias de almoço que já aconteceu comigo, com você, e com todo mundo. É a história do cara que perdeu o almoço e do almoço que perdeu o cara Diz mais ou menos assim Perdi meu almoço... lá no Porquinho Dou tudo que eu tenho... por um lombinho Seja com sal ou com suco de uva Minha barriga geme por suflê Geme geme, uh, uh, por suflê Geme geme, ahh, por suflê (2 vezes) Não durmo de noite Passando mal Será que foi o óleo Ou foi o sal Seja sem o sal ou com suco de uva Minha barriga geme por purê Geme geme, uh, uh, por purê Geme geme, ahh, por purê (2 vezes) Vocês podem estar pensando Que eu não tenho grana pra comer lá no Porcão, e não tenho mesmo Mas no Porquinho tem sobremesa Que é de graça Isso então é uma beleza Mesmo sem o sal ou com suco de uva Minha barriga geme por patê Geme geme, uh, uh, por patê... ieh ieh por patê (2 vezes)

“É nóis”

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Ladrões invadiram uma agência bancária no interior do Estado do Mato Grosso do Sul e levaram uma grande quantia. O assalto só foi percebido quando os funcionários do banco chegaram para trabalhar e viram que havia um buraco no teto. Um recado escrito à mão foi deixado no local do crime pelos assaltantes com os seguintes dizeres: “Cem arma, cem drogas, cem violência — agradecemos a preferencia e acima de tudo nossa percistencia — é nóis”. (Revista Língua Portuguesa nº 37, novembro de 2008)

Qual a maior palavra?

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Pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico A expressão médica, rara no Brasil, tem 46 letras e descreve quem caiu doente por aspirar cinzas de um vulcão . A segunda maior palavra do idioma é “anticonstitucionalissimamente”, com 29 letras. (Revista Língua Portuguesa nº 35, setembro de 2008)

Não tem anos em que você gostaria que o Natal chegasse mais cedo?

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Se este for um desses anos, saiba que o Núcleo de Literatura do Espaço Cultural atendeu seu desejo e segunda, dia 8, às 20h, no Teatro Garagem, nós prometemos emocionar você com a mais bela coleção de músicas e poemas de Natal que você jamais ouvirá! Venha e traga seus amigos! Nesta noite especial, o coral Serenata de Natal da UnB interpretará canções como Noite Feliz, Deixei Meu Sapatinho, Cavaleiros Reis e Boas Festas enquanto o cantor Alírio Netto, com seu teclado, interpretará Christmas Song e a histórica e divertida 12 Days of Christmas . Poemas de Drummond, Cecília Meireles, Manuel Bandeira, Fernando Pessoa, João Cabral de Melo Neto, Olavo Bilac e Marco Antunes. Quer mais? Pois tem! Será a noite de revelação dos vencedores e a entrega dos prêmios do 2º Desafio aos Escritores do Espaço Cultural da Câmara dos Deputados. Entregaremos o Troféu Sindilegis em 8 categorias e aos 3 finalistas dessa impressionante maratona literária. Na ceia, estrogonofe, salpicão natalino, farofa sofist

Fodopa

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Luci Afonso — E aí, belezinha? Joinha? Tudo em paz? - Dois beijinhos, o sorriso franco, o aperto de mão. —Bem-vinda, querida! - A risada solta, a voz forte, o abraço sincero. — Saudações poéticas! - O olhar amoroso, o passo firme, a onda de calor. — Oi, véi! - O frescor, o futuro, a juventude. Assim sou recebida no portal intergalático a que cheguei depois de longa viagem. — É dia de batismo! - Sou levada ao jardim e batizada com a água fresca que esguicha da mangueira, antes de começar o trabalho do dia. Trabalho, não: paradinha. As paradinhas são resolvidas uma a uma, com a ajuda de todo o grupo. Algumas são estranhas — estranhas, não, bizarras: onde colocar as enormes cabeças de papel que servirão como vírus para a nova campanha de divulgação? As figuras parecem não caber em nenhum lugar da Casa. — É fodopa! - todos concordam, enquanto se sentam ao redor da mesa para o brainstorming : — Eu pensei num móbile gigantesco, absolutamente impregnante. — E se a gente... tipo... pendurasse

O ponto

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Emanuel Mazza Meu sangue percorre caminho entre ruas escusas, intransponíveis, obstruídas na ânsia de si mesmas, num entrave certo à vida. Ele faz o que tem de fazer, segue sua sina, busca o aconchego de outros mares, e eu, não sei se quero ir com ele, ou apenas me deixar ficar, soltar amarras e ansiar a morte, naturalmente como deveria ser, se hoje não fosse, longe de tantos recursos, paralisado no cansaço do corpo, preso na inércia de mim. Melhor não pensar, uma vida inteira pautada em razões, em caminhos e atitudes racionalizadas, em porquês delineados, essa conduta de herói, de dominador, daquele que dispõe dos fins e dos meios (ilusão), me levou aonde estou, ao trombo. O trombo é um ponto no caminho. Um ponto de sangue coagulado no tempo. Procuro não pensar. Há tantos significados que pensar seria crime, há tantas variáveis na matemática do existir que é impossível o pensar. Apenas deixar vir, as imagens cintilam como idéias, estrelas que pulsam na noite, ao acaso. O sopro seco do

29º Sarau da Câmara dos Deputados

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O Núcleo de Literatura convida para o último sarau do ano, que será a festa de encerramento das atividades em 2008 e noite da entrega dos 8 prêmios do 2º Desafio aos Escritores, que serão conhecidos durante o sarau. Haverá apresentação do Coral da Serenata de Natal da UnB e do cantor Alirio Netto. Os mais belos poemas de temática natalina serão lembrados nesta noite mais do que especial. Coquetel: Ceia literária Venha, convide seus amigos, participe! 8 de dezembro 20 h Teatro SESC Garagem - 913 Sul Entrada franca

Morzinho

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Luci Afonso 9h — Bom dia, morzinho! — Bom dia. — Dormiu bem? — Acho que sim. Não lembro. — Já tomou o seu todinho? — Ainda não. — Pede à Dôra para fazer bem quentinho. — Tá. — Já começou a tarefinha? — É. — Então, começa e pega firme. Depois eu ligo de novo. Um beijo e um abraço. 10h30 — Oi, morzinho! — Oi. — Terminou a tarefinha? — Sim. — Fez direitinho? — É. — Então, descansa um pouquinho até o almoço. Enche a barriguinha, viu? Um beijo e um abraço. 13h — E aí, morzinho, já está prontinho? — Tô. — Escovou os dentinhos? — É. — Penteou o cabelinho? — Sim. — Tá cheirosinho? — Acho que sim. — Pede à Dôra o dinheirinho do lanche, viu? Cuidado no elevador. — Tá. — Vai com Deus. Boa aulinha. Um beijo e um abraço. 18h — Oi, morzinho! — Oi. — Tá cansadinho? — Sim. — Foi boa a aulinha? — É. — Tá com saudade de mim? —Tô. — Me dá um beijo e um abraço. Hum! Te amo, filhinho. — Eu também, mãe.

O que vejo

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Isolda Marinho Quando olho quase tudo e nada vejo Apenas fito leves riscos de lampejo Não vislumbro o horizonte que almejo Contemplo o sonho invisível que não olho sob a luz indivisível do meu olho Miro enfim o que aparece, não escolho Quando observo as tantas curvas que tracejo Prevejo até além das linhas de minha palma É que atingi o ritual do meu cortejo Então me vejo com o olhar da minha alma

Sonho bom

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Luci Afonso ...Segunda-feira Grande festa com crianças. Coloco broche de borboleta na minha roupa. Rapaz me convida para olhar estrelas e depois namorar. Terça-feira Um homem de uma tribo me põe vários colares e pulseiras. Dois cômodos grandes são meu ateliê. Adoto menina que é menino. Quarta-feira Encontro jóias pelo chão. Balanço bem alto. Pessoas gostam de mim. Quinta-feira Todos estão com o cabelo mais bonito. Homem com filho pequeno se interessa por mim. Dou meu livro ao Presidente Lula. Sexta-feira Príncipe me convida para ir na carruagem com ele no dia da coroação. Homem bonito me ajuda a mudar a casa. Sábado Rapaz toca violoncelo para mim numa plantação de morangos. Passo mel nas coisas. Seguro menininha preocupada numa biblioteca. Domingo... Rapaz me leva para a casa dele por um caminho de cetim. Homem tatua poema da paciência no meu braço.

Poética

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Isolda Marinho A poesia em mim se infiltra, penetra, invade, adentra, habita. Quando faço verso bom, sou Drummond . Quando crio rima boa, sou Pessoa . Musicando os ideais, vem Vinícius de Morais . Quando a carne se desnuda, só Neruda . Se aos 80, sou menina, quero Cora Coralina . Se escrevo até sem eira, por que não ser o Bandeira ? E na arte de rimar como é bom o meu Gullar ! Se na métrica sou a tal, quero ser João Cabral . Se um poema não me engana posso ser Mário Quintana . Versifico o que é belo, sou Tiago , o de Melo . Nas Vertentes de Jovina , minha palavra se anima. E se escrevo para o céu... são Tremores de Emanuel . Tremo, vibro, queimo e ardo num poema de Abelardo . Poetando a vida infinda vem Elisa , a Lucinda . No Rubi de Amneres , sou Cecília " Meio reles ". No meu verso submerso, eis aí meu universo.

28º Sarau da Câmara dos Deputados

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O Sarau da Consciência Negra trará os cantores Angela Regina e Wilson Bebel e os atores PC Sanvaz e Vanessa di Farias, entre outros, interpretando textos de Castro Alves, Elisa Lucinda, Conceição Evaristo, Luiz Gama e Marthin Luther King. Participação especialíssima de Máximo Mansur & Jorge Amâncio. Coquetel com pratos da culinária de origem africana. Entrada franca.

Rouxinol, Pombinha e Cotovia

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Luci Afonso Olhou para os quatro cantos do teto, como sempre fazia ao acordar. Fez o sinal-da-cruz da direita para a esquerda, depois ao contrário. Recitou a Oração da Serenidade em voz baixa. Era tarde, o dia já clareava. — MEU BEM, ESTOU COM SAUDADE. VAMOS NOS VER HOJE? ROUXINOL. - Selecionou os dois números. Alongou-se, fez a ginástica dos safenados, passou um fax para o Fernando Henrique. Inclinava a cabeça bem para trás para tomar os remédios dispostos em ordem alfabética no criado-mudo. Guardou o pijama preferido, que sua filha lhe dera de aniversário há 20 anos. Só dormia bem quando o vestia e calçava meias, costume herdado da tia Albertina. Conferiu o cabelo no espelho do banheiro e decidiu que não caíra nenhum fio desde o dia anterior. Ajeitou os poucos que restavam. — PRECISO DE VOCÊ. ESTOU COM MUITO T... BJS. - Enviou para ambas. Estava a perigo, não conseguiria passar a noite sozinho. Duas bananas, uma lima-da-pérsia, um iogurte de morango, que ele tomava aos goles, movendo

Cigarras

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Isolda Marinho Cigarras soturnas sibilam cintilam simulam sob sol setembro Cigarras singelas solenes sozinhas silenciam sob céu cidade Cigarras sinceras se soltam soletram suspiram Cigarras são seres sinistros sensatos sedentos cigarras sonoras sossegam sussurram saciam cigarras são santas sinais silentes silvestres cigarras sinfônicas seus essessssszzzzzzzzzz

Pesadelo

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De: luci.afonso@terra.com.br Enviada em: segunda-feira, 3 de novembro de 2008 10:52 Para: elza.sobrinho@uol.com.br Assunto: Lista Querida Elza, Aqui vai a lista que você pediu para analisarmos na próxima sessão. Ela se refere ao mês de outubro. Tentei organizar por assunto, para facilitar. Bj “ Ataques Atacada por um tarado de toalha. Um poeta louco me atacava. Monstros atacavam a cidade. Animais Cachorro nos mantinha em cima de uma cerca. Tentando escapar de cidade escura. Galo queria me bicar. Um lobo atacava a casa e eu o dominava pelo pescoço. Lindo pássaro assassino. Corpo Limpando meus dentes removíveis. Pernas não conseguiam subir escada. Batendo em mulher que tinha queimado meu olho. Sexo Sexo selvagem com surfista prateado. Ex-alcoólatra com tendências suicidas queria me namorar, mas a mãe dele exigia caução em dez vezes. Culpa Arrumando coisas para ir para a cadeia, mas era perdoada. Violência Mulheres invadiam festa, torturavam e matavam. Parque de horrores. Fugindo da gu

Poeta com P

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Isolda Marinho Poeta com P pisa no palco pede a palavra e propõe poesia. Pincela um poema promete o perfeito produz paraíso projeta no peito o ponto preciso Poeta com P parece Picasso pinta palhaço pulsa, pranteia na praia passeia Poeta com P primeiro procura a página pura prepara o pincel pega na pena perturba o papel Poeta percebe permite proclama persiste pinça princípios preenche a penumbra Poeta com P é profeta pressente o perigo passa, tem pressa Poeta com P parte prá Passárgada Poeta com P é porreta provoca publica protesta propaga pratica Poeta é presente propala o perfume prateia o pretume Poeta professa protege penetra perfaz Poeta com P pretende Paz Isolda Marinho é alagoana que chegou a Brasília ainda menina. Formou-se no Curso de Letras da Universidade de Brasília e foi professora da Fundação Educacional do Distrito Federal. Poetisa desde os 14 anos, recebeu premiações em vários concursos literários. Publicou "Sementes de Amora", em 2000, e "Viço do Verso&qu

Cordel das Festas Populares

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Gustavo Dourado A Ciência do Folclore: Aprendi com o Cascudo... Patativa deu o mote: Ariano conteúdo... Vitalino esculpiu: Cartola nos disse tudo... Baião de dois:Farinhada A sagrada rapadura Bebo uma talagada Gole de cachaça pura Para cantar o Brasil: E os festejos da cultura... São muitos ciclos festivos: Ano-Novo...Carnaval... Ciclo das Águas e do Divino: Sacro ciclo quaresmal... Ciclo junino e julino: Papai Noel no Natal... As doze noites festivas: Iniciam-se no Natal... O culto ao Sol Invictus: Antigo e tradicional... Vai até 6 de janeiro: Reis Magos universal... Diversas festividades: Festas do Cristianismo... Divindades, santos, santas: Eclético ecumenismo... Nosso Senhor, Nossa Senhora: Procissões do sincretismo... Folguedos, bailes e cultos: Práticas devocionais... Os índios também celebram: Fazem os seus festivais... Tropos, autos, malhações: Votos sobrenaturais... Mani.fest.ações de rua: O Galo da Madrugada... Trio Elétrico da Bahia: No Cerrado a cavalhada... Catira...Coco..

Meninas gordinhas

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Luci Afonso Sempre fui perseguida por meninas gordinhas, feias e míopes. Lembro-me, especialmente, de três. A da escola primária nunca me deixava entrar na roda do recreio: — Ela, não! As colegas obedeciam com medo do punho forte, que derrubava até meninos. Eu me sentava na escada do pátio e comia o lanche. A gordinha, com ar de triunfo, não tirava os olhos de mim. Terminado o primário, ela se mudou da cidade. A da adolescência tinha uma bunda enorme, que fazia sucesso entre os rapazes. — Fala “chuchu”! - Ela provocava, imitando o biquinho que eu fazia ao pronunciar essa palavra. Todos achavam muita graça. Depois do ginásio, nunca mais tive notícias dela. Encontrei a terceira gordinha na Comunhão Espírita, onde trabalhávamos como voluntárias. Na primeira vez em que conversamos, ela abriu um meio sorriso e comentou: — Você parece uma freira! - juntando as mãos, como numa prece. Sempre que nos víamos, ela repetia o gesto. Algum tempo depois, ela deixou a Comunhão e nunca mais a vi. Sempr

Fiapo d’água

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Antônio Cardoso Neto Não muito longe do mar, o fiapo d’água desembrenha-se da rocha nua no pé da serra para mais adiante emendar-se com outras águas, mudando inúmeras vezes de nome e de dono como um cão vadio. Logo mais, passa a chamar-se Tietê. Ao contrário das corredeiras que se desgarram das encostas escarpadas da serra e se lançam no vazio buscando o mar desesperadas, o rio recém-nascido inicia sua sina cabocla de costas para o Atlântico, levando na corrente mansa quem ou o quê se destine ao interior. Antes, passa pela urbe desmesurada, onde recebe mais detrito que qualquer outro rio do universo. Torna-se uma gosma que a perpassa lentamente e empesta o ar, devolvendo-lhe os insultos. Só muito depois é que reaparecem alguns lambaris e lambe-pedras. Não recupera mais a transparência. Depois de cruzar cafezais e pastagens, se enfia pela vastidão pálida e vulgar dos canaviais. Acolhe o Piracicaba, intumesce o ventre em Itapuí, encontra o Paraná e se embaralha a outros nomes tupis vindo

Breakfast

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Marco Antunes Calling you (Bob Telson) A desert road from vegas to nowhere some place better than where you've been A coffee machine that needs some fixing In a little cafe just around the bend I am calling you Can't you hear me I am calling you Era uma estrada deserta entre Vegas e nenhum lugar que me pareceu merecer um nome — e talvez Mojave haveria de ser o sobrenome de qualquer ponto no mapa — se houvesse a possibilidade de encontrar algum no porta-luvas abarrotado de papéis sem ordem (ou motivo de arquivo) sobre trastes com aspiração a lembranças. Parado no acostamento com os dedos queimados pelo copo de café desproporcional, eu olhava a mulher recostada em meu carro com seu jeans imundo e me perguntava em que limite da solidão eu começaria a usar de algum critério para não dormir sozinho. O vento empoeirado da estrada sugeria aflito um rumo para os lados da Califórnia, mas a possibilidade de chegar sem mim a algum destino, impressão que oceanos sempre me causam, aconselha

Sarau Festas do Povo

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O Espaço Cultural e o Cefor convidam para o Sarau Festas do Povo, que celebra as raízes culturais brasileiras e está entre as comemorações do Dia do Servidor. As manifestações culturais de um povo são as raízes de uma nação, a sua "marca" e trazem consigo as histórias e as lendas do seu passado, conscientizando as pessoas do caminho traçado até chegarmos aos dias atuais. Um povo que preserva sua cultura sabe direcionar o rumo a ser seguido e possui identidade própria. Cacuriá, Folia de Reis, Viola Caipira, Catira são alguns exemplos destas manifestações que serão apresentadas no evento. Venha participar desta festa! Programação 19h Recepção – Cia. Mambembrincantes Hall de entrada 19:30h Catira e Folia de Reis – Grupo Irmãos Vieira Hall do auditório Cuitelinho (Paulo Vanzolini) – Marcos Mesquita, viola caipira Saudades da minha terra (Goiá) – Marcos Mesquita O Lema do Nordestino (Amigão – Alberto R. da Silva) – Anabe Lopes Carnaval em Pirapora (Adilson Cordeiro) – Isolda Mar

Relatório sobre a mamãe

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Luci Afonso De: claudia@terra.com.br Enviado em: segunda-feira, 27 de junho de 2005 Para: fabio@tecnomix.com.br Assunto: Relatório sobre a mamãe Querido irmão, Tudo bem por aí? E a viagem à Disney? Adorei a sua foto com o chapéu de pirata e a caneca do Mickey. Ontem, eu e o Claudinho fomos à chácara, depois de muito tempo, e fizemos uma triste constatação: a mamãe está retornando ao estado selvagem, talvez ao nível do primitivo Homo Sapiens . Qualquer dia vamos encontrá-la em cima de uma árvore, e não será de se estranhar! Os indícios dessa regressão são vários: 1. Ela se alimenta do que encontra na natureza, por exemplo, frutas ou verduras que ela mesma plantou; 2. Bebe água diretamente do poço, porque acabou a mineral; 3. Raramente penteia o cabelo (agora está ruivo, por causa do sol) e toma banho a cada três dias; 4. Vive no escuro — guia-se mais pelo olfato, ainda que a visão de longa distância funcione precariamente. O mais grave, mano, é que mamãe está quase surda e só abre o po

Coriandrum et Petroselinum

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Antônio Cardoso Neto Tanto os sérvios quanto os croatas falam a mesma língua, mas a escrevem de maneiras diferentes. Por imposição católica romana, os croatas usam o alfabeto latino, ao passo que os sérvios utilizam o alfabeto cirílico por determinação ortodoxa bizantina. O Híndi, que se fala na Índia, é a mesma língua que é chamada de Urdu no Paquistão. Mas por ser o Paquistão majoritariamente muçulmano, o Urdu é grafado no alfabeto em que o corão foi escrito: o arábico. Já o Hindi é escrito no alfabeto devanagárico ou Devanágari, que significa, literalmente, “escrita sagrada” em Sânscrito. De qualquer maneira, o idioma é o som, não a escrita; é como se fala, e não como se registra a fala em um papel. Senão, o sinônimo de “idioma” seria “dedo”, e não “língua”. No frigir dos ovos, essas pequenas diferenças na maneira de escrever, por serem frutos de diferenças maiores, são suficientes para que sérvios e croatas se trucidem mutuamente, da mesma maneira que o fazem paquistaneses e indian